Reconstrução da cápsula superior
O que é a Reconstrução da Cápsula Superior?
A Reconstrução da Cápsula Superior (RCS) é uma técnica cirúrgica desenvolvida para tratar lesões irreparáveis do manguito rotador. Esta técnica envolve a utilização de enxertos para substituir a cápsula superior do ombro, que desempenha um papel essencial na manutenção da posição da cabeça do úmero e na biomecânica normal do ombro. Essa cirurgia é particularmente indicada para pacientes que apresentam dor intensa ou perda de força na elevação ou flexão do ombro, mas que não apresentam artrose significativa, condição na qual a artroplastia reversa do ombro seria mais indicada.
Quais são as indicações para a Reconstrução da Cápsula Superior?
A Reconstrução da Cápsula Superior é indicada principalmente em casos de lesões extensas e sintomáticas do tendão do supraespinhal, especialmente em pacientes ativos e que apresentam deltoide e trapézio funcionais.
As principais indicações incluem:
- Rotura extensa e sintomática do supraespinal (associadas ou não a lesões do infraespinhal.
- Paciente ativo (independente da idade).
- Musculo deltoide e trapézio funcionais.
- Cirurgia prévia de manguito rotador, que tenha apresentado relesão.
Contraindicações:
- Lesão irreparável ou atrofia gordurosa do tendão do subescapular.
- Rotação lateral muito fraca: com menos de 30° de rotação lateral ativa ou com sinal da cancela positivo.
- Artrose grave: artropatia do manguito rotador.
Como é realizada a Reconstrução da Cápsula Superior?
A RCS pode ser realizada utilizando enxertos autólogos, como a fáscia lata, retirada da coxa, ou enxertos de banco de tecidos (doadores). Recentemente, tem-se estudado o reforço desses enxertos com material sintético para melhorar sua resistência e a cicatrização. O procedimento geralmente é realizado por via artroscópica, de modo minimamente invasivo.
Quais são as vantagens da Reconstrução da Cápsula Superior?
A RCS apresenta diversas vantagens que a tornam uma opção atraente para o tratamento de lesões irreparáveis do manguito rotador:
- Evidências: bons resultados de curto prazo têm sido relatados em estudos clínicos.
- Decisão intra-operatória: permite que decisões importantes sejam feitas durante a cirurgia, com base nas condições específicas do paciente.
- Técnica artroscópica: pode ser realizada de forma minimamente invasiva, o que reduz o trauma cirúrgico.
- Baixa taxa de complicações: estudos mostram que a RCS tem uma baixa taxa de complicações quando comparada a outras técnicas.
- Pós-operatório menos complexo: a recuperação pós-operatória tende a ser menos complexa do que nas transferências tendíneas ou na artroplastia reversa.
- Não impede a revisão para artroplastia reversa: a técnica não compromete a possibilidade de uma futura artroplastia reversa, se necessário.
- Possibilidade de associação com transferências: pode ser combinada com outras técnicas, como reparos parciais ou transferências tendíneas.
Como é a recuperação pós-operatória?
A recuperação pós-operatória envolve o uso de tipoia com coxim de abdução por 6 semanas, seguido de um protocolo de reabilitação progressiva. A recuperação é geralmente mais lenta e leve em comparação com a do reparo tradicional do manguito rotador, exigindo um acompanhamento rigoroso para garantir a cicatrização adequada do enxerto e a restauração da função do ombro. Porém há clara tendência a ser menos dolorosa do que o reparo tradicional do manguito rotador, pois há menor tração dos tecidos nessa técnica.
Quais são os resultados esperados?
A reconstrução da cápsula superior do ombro (RCS) tem demonstrado resultados promissores para pacientes com lesões extensas e irreparáveis do manguito rotador. Os estudos indicam melhorias significativas na dor, função e amplitude de movimento após o procedimento. O sucesso da cirurgia está diretamente relacionado à adequada cicatrização do enxerto. Mesmo quando o enxerto ficou mais fino com o tempo, muitos pacientes ainda sentiram uma grande melhora na dor e conseguiram usar melhor o ombro. No entanto, quando o enxerto se rompeu de forma mais grave, os resultados foram menos satisfatórios. Em resumo, a maioria dos pacientes tem bons resultados com a RCS, especialmente quando o enxerto se mantém intacto e forte, o que ajuda a restaurar a estabilidade e a função do ombro.
Estudos científicos dos resultados
Nesse link você pode avaliar os artigos referentes aos resultados citados abaixo
Melhoria na Dor e Função: Estudos reportam melhorias estatisticamente significativas na dor e na função do ombro. As pontuações no American Shoulder and Elbow Surgeons (ASES) aumentaram entre 29,4 e 68,5 pontos, enquanto as pontuações na escala visual analógica (VAS) para dor melhoraram entre 2,5 e 5,9 pontos.
Aumento na Amplitude de Movimento: Os pacientes também experimentaram aumentos significativos na amplitude de movimento, com melhorias médias variando de 21,7° a 64,0° na elevação do ombro e de 9,0° a 15,0° na rotação externa. A flexão para frente aumentou de 27,0° a 142,7° no pré-operatório para 134,5° a 167,0° no pós-operatório, e a rotação externa aumentou de 13,2° a 41,0° no pré-operatório para 30,0° a 59,0° no pós-operatório.
Taxas de Complicações e Falhas: Embora a RCS tenha mostrado bons resultados, as taxas de falha clínica e radiográfica, incluindo rupturas do enxerto, variaram entre 3,4% e 36,1%. As complicações incluíram infecção profunda (0-2%), afrouxamento sintomático do âncora de sutura (0-4%) e rigidez do ombro (0-2%). No geral, as taxas de complicações, falha do enxerto e necessidade de cirurgia de revisão foram de 5,6%, 13,9% e 6,9%, respectivamente.
Satisfação dos Pacientes: A maioria dos pacientes relatou altos níveis de satisfação, com 90% dos pacientes satisfeitos no acompanhamento pós-operatório.
Quais são os riscos e complicações?
Um dos principais riscos da reconstrução da cápsula superior é a falha na cicatrização do enxerto, o que pode comprometer os resultados clínicos da cirurgia. A integridade do enxerto depende de vários fatores, incluindo o tipo de enxerto utilizado, sua espessura, e o grau de artrose presente antes da cirurgia. Em casos de artrose grave, a técnica geralmente não é indicada devido à alta taxa de falha.
Apesar de diversos estudos demonstrarem bons resultados clínicos, muitos deles avaliaram um alto risco de falha da cicatrização. A falha pode estar relacionada aos fatores citados acima.
Para pacientes sem artrose, uma das estratégias mais recentes para reduzir o risco de falha envolve o uso de reforços com materiais sintéticos, como malhas de polipropileno, que têm mostrado resultados promissores no curto prazo. Dois estudos recentes demonstraram que pacientes que receberam enxertos reforçados com malha apresentaram uma melhor cicatrização e remodelação do enxerto, com menor intensidade de sinal na ressonância magnética, sugerindo uma cicatrização mais robusta.
Além disso, o pós-operatório da reconstrução da cápsula superior exige um protocolo de reabilitação mais lento e rigoroso. Como a cirurgia tende a causar pouca dor no pós-operatório, é fundamental seguir cuidadosamente as orientações de imobilização e fisioterapia para garantir a cicatrização adequada do enxerto.
Diversos estudos apontam que pacientes que apresentam uma cicatrização completa do enxerto experimentam melhores resultados clínicos, com redução significativa da dor e melhoria na função do ombro.
Reconstrução da cápsula superior com o uso do tendão do bíceps
A Reconstrução da Cápsula Superior (RCS) utilizando o tendão da cabeça longa do bíceps tem se mostrado uma alternativa eficaz ao uso de enxertos como a fáscia lata. Ela também pode ser chamada de transposição do bíceps. A parte mais distal desse tendão é suturada em uma região mais medial do tubérculo maior. Estudos indicam que essa técnica oferece resultados clínicos positivos, com baixas taxas de reruptura e melhorias significativas na funcionalidade e na dor, mesmo um ano após a cirurgia. A RCS com o tendão do bíceps aproveita o próprio tecido do paciente, o que minimiza a morbidade no local doador e pode ajudar a estabilizar o ombro, reduzindo a dor e aumentando a amplitude de movimento, particularmente em lesões irreparáveis. Ainda faltam estudos de mais longo prazo ou comparativos. E esse tendão pode não estar viável para o procedimento por lesões parciais ou totais prévias.
Além disso, o uso do tendão do bíceps como enxerto para a RCS permite a realização de procedimentos totalmente artroscópicos, que são menos invasivos e não requerem materiais sintéticos ou enxertos de banco de tecidos. Essa abordagem não só preserva a fixação anatômica do tendão na glenoide, mas também proporciona uma solução biológica autóloga, que tem mostrado ser biomecanicamente comparável, ou até superior, ao uso de enxertos como a fáscia lata. Dessa forma, a RCS com o tendão do bíceps é uma técnica promissora, oferecendo uma combinação de eficácia clínica e simplicidade cirúrgica.
Alternativas à Reconstrução da Cápsula Superior
A escolha da técnica para tratar lesões irreparáveis do manguito rotador depende de diversos fatores, como a idade do paciente, o nível de atividade física, e a presença de artrose do ombro. Existem várias outras alternativas cirúrgicas que podem ser consideradas:
- Transferência do Trapézio Inferior: Utilizada para restaurar a rotação externa em pacientes com lesões irreparáveis do supraespinhal e infraespinhal.
- Transferência do Músculo Grande Dorsal: Alternativa em que o músculo grande dorsal é transferido para substituir a função dos tendões do manguito rotador danificados.
- Reconstrução do cabo dos rotadores: Técnica que utiliza um cabo de sutura para reconstruir parcialmente o manguito rotador.
- Tuberoplastia biológica: Modificação da tuberosidade maior do úmero para reduzir o contato subacromial.
- Artroplastia Reversa do Ombro: Indicada para pacientes mais idosos ou com artropatia do manguito rotador (artrose do ombro)
Referências
- Referências completas sobre o tema nesse link
- Resumo dos resultados clínicos
- Beraldo RA, Gracitelli MEC, Malavolta EA, Assunção JH, Silva FB de AE, Neto AAF. Tratamento das rupturas irreparáveis do manguito rotador: Reconstrução capsular superior com aloenxerto de fáscia lata. Rev Bras Ortop 2022;57:876–83.